9 de novembro de 2012



O Estrangeiro

                   A Sigmund Freud Associação Psicanalítica realizou nos dias 26 e 27 de outubro um seminário com o tema do estrangeiro que reuniu profissionais das áreas do Direito, da Linguística, da Antropologia para debater temas como o deslocamento, exílio, refugiados, exilados. A discussão foi rica na diversidade e abordou a passagem da língua materna à língua nacional, as possibilidades de traduções possíveis, os campos nômades de sentidos até a forma máxima de violência que é o silenciamento da língua. A questão da lei foi abordada desde a perspectiva de criar soberania,  dogmatização, até a compreensão de marcar fronteiras que visam a permeabilidade e o deslocamento que propicie as relações sociais entre os que passam a habitar um outro país e os que nele vivem como cidadãos, distinção também debatida entre nacionalidade e cidadania.
Ponto alto de nosso encontro foram os depoimentos de vida e do trabalho realizado – que evidenciam a prática que implica o sujeito – de Luis Varese, Cleber Kemper e Karin Wapeschowski sobre o trabalho com refugiados, mortos e desaparecidos políticos e o reassentamento solidário,  a partir de instituições como ACNUR, ASAV e Secretária dos Direitos Humanos da Presidência da República. Tema que nos convoca como uma realidade de nosso século onde temos 40.000 refugiados e em nosso país, passamos, através da Comissão da Verdade, a dar conta de conhecer e tornar conhecido o período da ditadura militar, suas práticas e suas vítimas.

                  Este encontro foi um exercício de interdisciplinariedade, pluralidade de ideias e da vitalidade da psicanálise em sua contribuição neste debate, tanto teórica quanto clinicamente, como demonstraram os trabalhos apresentados que fazem parte de nosso projeto SIG Intervenções Psicanalíticas.                      

7 de novembro de 2012

O Estrangeiro - Entrevista com Luís Varese

Entrevista com Luís Varese
Jornalista, antropólogo e ex-representante da ACNUR no Brasil.

1.Qual a sua experiência/ Conte um pouco de sua experiência com o estrangeiro/refugiado?
El tema principal del refugiado es que pierde su tejido social. Esto quiere decir que pierde su entorno, sus comidas, sus parientes, sus amigos el olor de su barrio o de su tierra. El sonido de la radio de sus vecinos. Las amigas con las que lavaba la ropa, la tertulia de la tarde con la mamá y las hermanas. El sabor de su café. El partido de fútbol con los amigos o la televisión del bar y sus cervezas para ver a su selección. La vida cotidiana con sus alegrías y sus tristezas, su trabajo y el derecho a llevar un salario a la casa. Pierde lo más simple y lo más fundamental de su vida. Esto ocurre de un momento a otro, sin planificarlo. Es el cambio más violento que se pueda tener. Ella y él, su familia, tienen que afrontar cambios brutales, inesperados para los que NADIE está preparado. NADIE así con mayúsculas y mucho menos personas que no tienen militancia, personas que creen que su país es el mundo conocido, personas que piensan que su mundo es el único que existe y en el cual es posible vivir, personas campesinas que se bañan en el río y que de golpe se encuentran en una ciudad fría y con una agresividad desconocida.
Frente a ello el trabajo requiere mucho afecto, mucho amor mucha ternura, mucha solidaridad. Sin esto no hay ninguna posibilidad de restituir lo perdido o de crear un nuevo espacio. Este trabajo requiere de mucha militancia humana, esa es mi experiencia con los y las refugiadas y vale también para los migrantes pobres. Una experiencia de 24 años trabajando para buscar soluciones conjuntamente con las refugiadas y los refugiados, las ONGs, el Estado y las Naciones Unidas, en este caso el ACNUR.
Quisiera añadir que me disculpen que hable en primera persona, pero me parece importante decir que mi esposa, mis hijos y yo hemos sido refugiados durante muchos años. En mi caso durante 20 años no pude regresar a mi país.  Esto nos permite tener una vivencia muy cercana con los refugiados y las refugiadas. Sabemos lo que es estar como extranjero, perseguido en un país donde inicialmente casi no se tienen relaciones.
Por otra parte mi experiencia con exiliados se inicia cuando era periodista en Perú y muchos refugiados de Brasil, Argentina, Uruguay y Chile estaban en Lima. Eran poetas, políticos, escritores. Thiago de Mello y Darcy Ribeyro estaban entre ellos. Es mucho lo que aprendí en ese periodo, pero esa es otra historia.
 
2.De acordo com sua experiência quando Representante do ACNUR, quais os grandes desafios na esfera das Políticas Públicas para o acolhimento e integração do refugiado na América Latina?
Lo más importante es que las políticas públicas sean incluyentes y efectivas con toda la población, no solo para los refugiados, sino para toda la población en general. El acceso a la salud y la educación son fundamentales. La educación permite velozmente la integración de los niños y eso es un gran descanso espiritual, sicológico para las familias refugiadas. El derecho al trabajo es básico, sin él no hay forma de integrarse. En Rio Grande do Sul y en especial en Porto Alegre, la apertura es muy grande. Lo importante es que no haya privilegios, pero tampoco discriminación. Si hay privilegios, la población local se vuelve en contra y el refugiado o se humilla o se vuelve dependiente. El derecho a la documentación que le dé los mismo derechos es el otro elemento decisivo para la integración.

3.Como que o senhor vê o trabalho interdisciplinar frente ao padecimento/sofriment
o desses sujeitos (refugiados)?
El trabajo humanitario tiene que ser interdisciplinario. Es la combinación de muchas experiencias, la psicología, la solución laboral, la medicina, la asistencia social, la diplomacia.
No se puede entender un trabajo humanitario si no es interdisciplinario. Pero también hay que recordar que no hay éxitos, sucesos, sin una gran dedicación y mucho amor y solidaridad por la gente. Eso es lo fundamental.

4 de outubro de 2012

Jornada Interna, Psicologia Hospitalar, Assédio Moral e mais | SPRGS



Informativo da Sociedade de Psicologia do Rio Grande do Sul
Número 119 | setembro de 2012



Extramuros: outros lugares da experiência psicanalítica
O Comitê Exercitando a Escuta Psicanalítica convida os sócios da SPRGS para mais uma edição de nossa Jornada Interna. Nesta edição tentamos ampliar os horizontes. Ao invés de discutirmos casos clínicos atendidos na formatação clássica, estamos convidando para pensar nossa escuta psicanalítica e ação terapêutica em outros espaços possíveis: no extramuros.

Veja a programação completa aqui.


13 de agosto de 2012

Projeto SIG Intervenções Psicanalíticas Fórum – Exclusão e Inscrições Psíquicas: da escuta psicanalítica no social


Nosso encontro foi de muita troca, discussão e emoção.  As histórias das vidas / grupos narradas em cada uma das exposições se entrelaçaram com as experiências que foram para nós os momentos e situações de nossas escutas.

A primeira mesa: Educação em contextos de vulnerabilidade teve como mote os grupos que realizamos na rede municipal. Experiências inaugurais onde trabalhamos a inclusão/exclusão na perspectiva das diferenças geracionais e do lugar de dupla inscrição que um grupo de professores/supervisores ocupa frente à proposta institucional da inclusão de crianças com cuidados especiais nas escolas de primeiro grau. Contamos com a participação da Ana Maira Zortéia, que iniciou sua fala nos contando de uma foto/cena que retrata os múltiplos e diferentes pares de sapatos deixados na entrada de uma sala de aula: sapatos mais e menos novos, modernos, estragados, antigos, coloridos ... marcando a diversidade de “sair da cerquinha” e o  paradoxo da sociedade excludente frente a uma escola inclusiva. Discussão que versou sobre o saber como um processo que nunca acaba e o necessário reconhecimento entre os pares. Importância das redes, da infância como lugar de potência. Lugar das crianças, dos professores, como produtores de trabalho/aprendizagem e o nosso enquanto psicanalistas que propomos uma escuta, um lugar de transferência para falar do sintoma e do subjetivo.

A segunda mesa: O mal-estar na saúde: da violência à diferença, apresentou a loucura e o “estrangeiro”, como aquele inquietante, não familiar, o Unheimliche que nos falou Freud. A partir da fala dos grupos discutimos o tema da diferença não só na perspectiva da diversidade, mas também da (in)diferença que faz com que o outro seja estranho, gerando violência. Violência que advém da identificação dos membros do grupo com a loucura (em um grupo), e violência frente à entrada de novas pessoas em (outro) grupo de voluntários, onde se passa a mesma inquietude: a percepção da invasão. Fecha-se o caminho para o reconhecimento do outro como aquele que pode agregar, persiste o mal-estar. Aí instala-se nossa intervenção.  Neste entre – lugares desenvolveu-se a fala de Ana Lucia Marsillac que a partir da arte correio de Paulo Bruscky, abordou a saúde coletiva e o ato analítico a partir de uma mesma concepção ética, ressaltando, no entanto, como ainda ocorre uma dissociação entre estes dois campos na produção da saúde. Diagnosticados e não diagnosticados a partir do projeto Radio Nikosia, ilustra a proposta de expressar o “corpo louco” na consigna “saca a pasear tu loucura”, resposta de produção de subjetividade frente à individualidade que aliena o sujeito.
                                       
A terceira mesa: O trauma e as recomposições do sujeito abordou o trabalho com os refugiados que a ASAV/ACNUR realiza no RS e a parceria com nosso Projeto. A apresentação da Karin Wapechowski foi marcada pelo relato as experiências de impasse frente ao sentimento de impotência e de ação no trabalho de reassentamento solidário. A temporalidade foi o tema marcante nesta discussão que reúne o tempo real na experiência de inclusão do refugiado em outro país/cultura e o tempo de elaboração do traumático da vivência de se tornar um refugiado/ excluído de si e de sua cultura. O trabalho realizado com um grupo deste programa revelou como o corpo, como alternativa de mostrar a intensidade do vivido, torna-se, por vezes a única alternativa de expressão para quem não tem o direito à fala. O tempo necessário para a elaboração do trauma e o tempo de escuta possível com esses sujeitos, foi o centro da discussão que evidencia a potência da psicanálise na escuta de sujeitos nos diferentes espaços internos/externos, assim como Garcia Marques nos legou em Cem Anos de Solidão.

Foi uma experiência compartilhada que revigora nossas práticas e nossos saberes. O projeto SIG Intervenções Psicanalíticas ampliou-se com a troca entre pares e convidados e fortaleceu a proposta da escuta psicanalítica no social.

22 de junho de 2012

Fórum – SIG Intervenções Psicanalíticas


Exclusão e inscrição psíquica: da escuta analítica no social

Fórum remete a um lugar e a uma reunião de pessoas.  Na praça pública na antiga Roma é onde acontecia o fórum: um  lugar de discussão e também um grupo de discussão.
Assim pensamos o duplo sentido de nosso encontro: fórum para demarcar um lugar para discutir na diversidade o nosso fazer. O lugar do fazer da psicanálise além do setting analítico tradicional, ou seja, de nosso consultório e um lugar delimitado por um pedido que nasce de um grupo que se encontra com um mal-estar. Amplia-se assim o lugar do individual para o de um grupo social.
Os dispositivos para este encontro continuam sendo aqueles que caracterizam e especificam  o trabalho de um analista: o binômio  escuta/fala. Um que fala e outro que escuta, ou seja, o lugar do analista que recebe o que é endereçado pelo sintoma do analisando.
Nesta primeira marcação do que é escuta[1] verificamos que o lugar de escuta analítica sempre supõe uma transferência, repetição de uma vivência histórica que o analisando não recorda e que endereça à figura do analista sob a forma de uma reação de amor ou de raiva.
Assim o lugar de escuta do analista é o da transferência desde onde pode operar. Mas a condição para que isto ocorra é que ele seja abstinente.  Ser abstinente é não atribuir sentido à fala do analisando, mas sim se colocar como objeto da transferência do analisando. Desta forma se cria um paradoxo: estar embebido do transferido, mas se abster de atribuir sentido ou julgamento.  Cria-se então o lugar da escuta e da ética.                   
Esse é o dispositivo que utilizamos em nossas intervenções: criar um espaço/lugar de escuta que favoreça a fala dos sujeitos de um grupo que enfrenta um sofrimento. Cria-se um espaço intersubjetivo onde enigmas podem ser identificados e decifrados a partir do ato de escutar-se, que coloca a todos imersos no compromisso ético. Pensamos que a mudança de enquadre do individual para o coletivo, em situações de grupos em instituições de educação e saúde sejam favorecedoras desta experiência de transferência e da fala e passam a diminuir a resistência diante do fazer.
Diferenciamos claramente a abstinência necessária à criação de um espaço de escuta daquilo que é chamado equivocadamente de neutralidade. Estamos de acordo com Soares[2] quando diz ser necessária a convicção em qualquer ato, pois a ação incide em um futuro que jamais será neutro. Nesta perspectiva não somos neutros em nosso fazer. Estamos sim comprometidos com os dispositivos analíticos em novos espaços onde o falar dá lugar a uma mudança.
O sofrimento social tem a que ver com o fato de que há grande quantidade de pessoas que não tem inscrição, tem perdido ou tem sido despojada de suas inscrições como pessoas. Este estado de exclusão /invisibilidade se repete, muitas vezes, nas instituições que se ocupam com estas pessoas. Buscar novas formas de inscrição é possível através da dialógica da fala e da escuta, que dá lugar à inclusão social.
Podemos pensar que toda política de exclusão se emparelha com a injustiça, quando “impõe a uma pessoa um único destino e uma identidade fabricada com preconceitos que corresponde a destruir sua liberdade e aprisioná-la em uma única e invariável possibilidade de ser”.[3] É onde presenciamos muitas vezes a violência do educar e do curar.     
Assim, pensamos junto com Daniel Olesker[4] que trabalhar com um modelo de política social inclusiva requer como critérios: que cada um tenha ingresso segundo suas necessidades; que haja um caráter universalista de acesso; que ocorra a condução do estado; que haja participação social.
Juntamo-nos a essa proposta pensando nossa prática.  


Programa Preliminar
Dias 03 e 04 de agosto de 2012

Sexta-feira  18h30min  Abertura
                    18h45min  Mesa:  Educação em contextos de vulnerabilidade
                    20h45min  Lançamento da Revista da SIG


Sábado 9h00min Mesa: O mal-estar na saúde: da violência à diferença Intervalo
             11h00min  Mesa: Políticas inclusivas




[1] Todas as referências sobre a escuta e a abstinência são extraídas do trabalho Escuta: quando a abstinência se constitui, de Denise Hausen e Bárbara Conte. Revista do CEP de PA. Vol.16. 2009.
[2] Comunicação de Luis Eduardo Soares na Jornada da Sigmund Freud Associação Psicanalítica. 2009
[3] Soares, L.E. Justiça: pensando alto sobre violência, crime e castigo. Nova Fronteira. P.47. 2011.
[4] Economista e Ministro do Desenvolvimento Social do Uruguai, em sua fala no III Colóquio de Emergência Social: Fragmentação-Integração. Maio de 2012.   

16 de maio de 2012


Reconhecimento



“Não há mapa, só há bussola”

Frase citada por Luis Correa, no III Colóquio de Emergência Social, realizado pela Associação Psicanalítica do Uruguai nos dias 04 e 05 de maio em Montevidéo. Encontrarmos rumos para o nosso projeto SIG Intervenções Psicanalíticas, a partir de aportes teóricos e de encontros como este, nos dá uma direção para construirmos mapas de reconhecimento de território. Esta é a ideia de reconhecimento que encontramos no trabalho com os grupos nas diferentes frentes de intervenção.

Reconhecimento possui o significado de aceitação, de legitimidade. Em Psicanálise, podemos relacionar o reconhecimento ao teste de realidade. A possibilidade de reconhecer o seu lugar. Não se confundir com o outro e saber dos limites do seu território é que abre a possibilidade da construção de identidade.

Se, por um lado, os sujeitos tornam o outro invisível, ou sentem-se invisíveis, não se sentem acompanhados e ficam presos ao seu narcisismo. Por outro lado, estão submetidos ao lugar que o outro lhe confere. O reconhecimento está no território entre o eu e o outro. Precisamos retomar o estudo da Psicopatologia da Vida Cotidiana. Mais do que nos perguntarmos sobre a Psicopatologia, quando estamos falando em intervenções extramuros, precisamos entender o que é vida cotidiana. O que seria cotidiano e não uma repetição mortífera? Qual é vida cotidiana hoje? Qual é a vida cotidiana de cada grupo?

Gustavo Leal, sociólogo, abriu como norte de nossa bússola de trabalho, o de construirmos um discurso que represente os ideais. Não bastam palavras sem representação e nem um silêncio que negue a violência. É preciso construir um discurso de reconhecimento de território e ideais para que os sujeitos possuam movimento e saiam da apatia.

O objetivo de um trabalho de intervenção psicanalítica é escutar os sujeitos a partir de seu lugar de inserção em diferentes grupos. Percebendo os seus limites e o seu papel no intercâmbio. Cambio significa troca e não mudança. Perceber que o passado integra-se ao presente é o cambio entre os sujeitos.

Participar deste encontro que abordou o tema da educação, da prevenção primária, da violência, de alternativas de intervenção: como as “maestras comunitárias”, dos muros, das drogas, da ação política de nosso fazer como psicanalista foi uma emocionante e estimulante vivência de nossa prática.

Simone Engbrecht e Bárbara Conte